"Mordecai escreveu estas coisas e enviou cartas a todos os judeus que se achavam em todas as províncias do rei Assuero, aos de perto e aos de longe, ordenando-lhes que comemorassem o dia catorze do mês de Adar e o dia quinze do mesmo, todos os anos, como os dias em que os judeus tiveram sossego dos seus inimigos, e o mês que se lhes mudou de tristeza em alegria, e de luto em dia de festa; para que os fizessem dias de banquetes e de alegria, e de mandarem porções dos banquetes uns aos outros, e dádivas aos pobres... Por isso, àqueles dias chamam Purim, do nome Pur."

(Ester 9:20-22,26)

"O Talmud assim declara: "Quando o mês de Adar se inicia, nós aumentamos a nossa alegria".

 

A festa de Purim comemora o dia da vitória do povo judeu sobre seus inimigos na época do Rei Assuero, durante o cativeiro dos judeus na Babilônia.

O Livro de Ester (Meguilá Ester), a base da festa de Purim, conta uma das mais queridas histórias bíblicas do judaísmo. Hamã, primeiro-ministro do rei, desenvolve um plano para aniquilar os judeus da Pérsia. Através de uma complexa sequência de eventos, a Rainha Ester, judia, e seu pai adotivo, Mordecai, conseguem interceder diretamente com o rei, estragando o plano de Hamã. É então proclamado o feriado de Purim.

O nome "Purim" vem da palavra hebraica "pur", que significa "sorteio", pois este era o método usado por Hamã para escolher a data na qual pretendia massacrar os judeus do país. Hamã havia emitido um decreto sem o conhecimento total do rei Assuero, determinando que o povo judeu deveria ser exterminado da terra sem qualquer direito de defesa.

Segundo a lei medo-persa, qualquer decreto, depois de emitido, não poderia mais ser revogado nem pelo próprio rei. A solução encontrada por Mordecai e pela rainha Ester foi a de se emitir um segundo decreto, dando o direito aos judeus de se defenderem.

De fato, apesar de Purim ser o dia mais alegre do ano, sua história é sobre a reversão desse édito de genocídio contra o povo judeu. Conta a história que, para salvar seu povo, Ester teve que enfrentar o rei. Por isso, ciente do grave perigo, pede a Mordecai: "Vá e reúna todos os judeus que estão em Shushan e jejuem durante três dias e três noites". Jejuando e pedindo perdão por todas as suas falhas, os judeus de Shushan buscavam a Proteção Divina. Apelaram para a Misericórdia Divina, pois sabiam, assim como Ester, que somente com a ajuda do Todo-Poderoso poderiam conseguir a anulação do decreto fatal. Desde então, para lembrar este acontecimento, os judeus jejuam no dia anterior a Purim. O "Jejum de Ester", Taanit Esther, é iniciado pouco antes do nascer do sol do dia 13 de Adar e acaba ao pôr-do-sol do mesmo dia.

Quando chega a noite e se inicia o dia 14 de Adar, começa a festa de Purim. Porém, antes de quebrar-se o jejum, ouve-se a Meguilá Ester. Esta deve ser lida na íntegra de um rolo de pergaminho e em voz alta, tanto à noite quanto na manhã seguinte. Todos devem ficar atentos durante a leitura para ouvir cada palavra, pois o propósito da leitura é entender o que ocorreu na época da Rainha Ester e aprender que os eventos de Purim não pertencem ao passado. Repetem-se, espiritualmente, em todas as gerações.

Na Meguilá estão mencionados alguns dos preceitos que devem ser observados nesta data, sendo que outros foram instituídos pelo próprio Mordecai.

Os quatro principais mandamentos do dia são:

  • Ouvir a leitura pública, geralmente na sinagoga, do Livro de Ester de noite e novamente na manhã seguinte (kriat meguilá)
  • Mandar presentes de comida para amigos (mishloach manot)
  • Dar caridade aos pobres (matanot le'evionim)
  • Comer uma refeição festiva (seudá)

Purim é uma festividade judaica única. Enquanto as demais festas religiosas enfatizam a espiritualidade – em Chanucá, por exemplo, acendemos velas que simbolizam a alma do homem e a Torá – Purim é guardada cumprindo-se quatro mandamentos, três do quais envolvem alimentos e bebidas.

Precisamos ter uma refeição festiva e abundante; enviar presentes com dois ou mais alimentos prontos para os amigos; doar dinheiro aos pobres, para que eles, também, possam desfrutar da festa; e estar presente na sinagoga para ouvir a leitura da Meguilat Esther. O principal tema de  Purim é a alegria, assim, além dos fartos alimentos e bebidas, realizam-se desfiles e celebrações, e as pessoas e crianças se fantasiam e usam divertidas máscaras.

Purim é uma ocasião festiva, mas pode dar a impressão de ser extremamente materialista. Mesmo a leitura pública da Meguilat Esther aparenta ser despida de espiritualidade, pois entre os 24 livros do Tanach (Torá, Profetas e Escritos Sagrados), é o único que nunca menciona o nome de D’us. Isso parece indicar que D’us não participou na história de Purim.

O mandamento dessa leitura da Meguilá parece ser a antítese das luzes de Chanucá: ao invés de dar publicidade a um milagre Divino, aparentemente aqui há uma negação do mesmo. De fato, podemos perguntar-nos por que a Meguilat Esther foi incluída no Tanach. Não se trata de um livro de mandamentos Divinos, como a Torá, tampouco uma ode a D’us, como o Livro dos Salmos. Pelo contrário, lê-se o Livro de Esther como um romance, onde há heróis e vilãos, tramas de conspirações e assassinatos, amor e sedução, reviravoltas, e, por fim, um final que foi plagiado, repetidamente, por escritores e cineastas: o mal se volta contra quem o iniciou, enquanto os heróis, após passar por um período de turbulência e sofrimento, emergem triunfantes.  Uma história fascinante e divertida, com certeza; mas seus autores acharam por bem não elencar D’us como um de seus personagens.

Um dia no qual comemos e bebemos, vestimo-nos com fantasias, realizamos festas e vamos à sinagoga para ouvir a leitura pública de uma história na qual não se menciona nem uma única vez o nome do Todo Poderoso parece contrário ao espírito do judaísmo. Contudo, nossos Sábios sempre prezaram a festa de Purim e nos ensinaram que deve ser celebrada como o dia mais jubiloso do calendário judaico.

Mas, se Purim é uma festividade tão sagrada, por que razão seus mandamentos são tão materialistas? E se a Meguilat Esther é um livro sagrado, digno de ser incluído no Tanach, por que razão não faz menção a D’us sequer uma única vez?

Falando de modo geral, todos os seres humanos se dividem em dois grupos. Quando algo notável acontece com os integrantes do primeiro grupo, eles o entendem como algo mais do que simplesmente sorte; consideram como evidência de que Alguém zela por eles. Para tais pessoas, tudo é um sinal ou mensagem Divina e nada na vida é simples coincidência. Em contraste, os que pertencem ao segundo grupo, mesmo crentes em D’us, não endossam a ideia da Providência Divina. Portanto, sempre que algo de fortuito lhes ocorre, eles o consideram uma coincidência, e sempre que são confrontados com uma situação de incerteza, sentem-se apreensivos e até temerosos, pois creem que nós, seres humanos, estamos sós neste mundo, sem ninguém que zele por nós.

Todos nós, judeus e não judeus, nos enquadramos em um desses dois grupos. Interpretamos os eventos felizes em nossas vidas como sinais Divinos, milagres? Ou os vemos como meras coincidências?

À luz desta pergunta, podemos abordar o mistério da Meguilat Esther não mencionar o nome de D’us sequer uma vez. Quem a escreveu? Não foi nenhum dramaturgo laico, mas seus próprios protagonistas: Mordechai e Esther. E foram os membros da Grande Assembléia, os Anshei Knesset Ha’Guedolá – constituída por 120 sábios, escribas e profetas – que  a incluíram entre os 24 livros do Tanach. Os autores da Meguilá omitiram propositalmente o Nome de D’us, e os Homens da Grande Assembléia corroboraram sua decisão, pois a história de Purim tem o propósito de nos ensinar uma lição que é ainda mais profunda do que a que nos é transmitida pelas velas de Chanucá.  Esta lição é que D’us governa Seu mundo enquanto Ele Próprio permanece oculto.  A mensagem da Meguilá é atemporal e universal.

Em Pessach, celebramos os milagres que D’us fez em favor do Povo Judeu na época de Moshé – no Egito e no deserto de Sinai.  Em Chanucá celebramos os milagres que D’us realizou em prol de nossos antepassados na época do segundo Templo Sagrado. Mas, desde então, quando foi que D’us realizou milagres? A Meguilat Esther ensina que o Todo Poderoso nunca cessou de fazer milagres, mas Ele agora trabalha por trás dos bastidores. Para simultaneamente fazer milagres e ocultar a Sua Presença e participação, Ele orquestra os eventos em nossas vidas em uma forma que nos faz imaginar a quem os atribuir: à Providência Divina ou simplesmente à sorte.

Não é apenas a Meguilat Esther, mas Purim como um todo que tem como seu tema básico e subjacente a ocultação Divina. Até mesmo o nome da protagonista da história, Esther, alude a isso. Este nome é derivado da palavra hebraica “Hester”, que significa “ocultação”, e alude ao conceito de Hester Panim – a ocultação da “Face Divina”: uma época quando D’us não mais Se revela abertamente.

De fato, Esther nem era mesmo seu verdadeiro nome, que era Hadassah. O nome Esther, muito comum na Pérsia antiga, fora escolhido para ocultar sua identidade judaica até o momento em que ela a tornasse pública.

O costume de usar fantasias e máscaras em Purim também faz referência à ocultação Divina. Como o relato da Meguilá, aparentam ser mero entretenimento, mas transmitem uma séria mensagem: a de que D’us usa um disfarce e uma máscara e estes são o curso natural dos eventos e as leis naturais do mundo, que ocultam a Sua Presença e a Sua Providência. De fato, os Cabalistas ensinam que a palavra hebraica Olam, mundo, deriva da palavra Helem, que significa “oculto”. Vivemos em um mundo no qual seu Criador e Governante – Aquele que verdadeiramente comanda o espetáculo – permanece oculto.

O Nome de D’us foi propositalmente deixado fora da Meguilá para servir como uma mensagem e um desafio para todos os judeus e, de fato, para todos os seres humanos: não apenas quando ouvirmos a história de Purim, mas em nossa vida diária, vemos sinais Divinos – milagres ocultos – ou apenas coincidências?

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